22 novembro, 2012

Rui Moreira, é agora, ou nunca

Deixei de votar para a Assembleia Constituinte, já faz umas dezenas de anos. Não é de agora que desisti de acreditar na forma como os candidatos à governação do país se apresentam ao eleitorado, e principalmente nos resultados do seu trabalho. Desde o 25 de Abril de 1974, não tenho memória  de ter tido a satisfação de ver Portugal a ser bem administrado, durante um mandato que fosse. Aguentei pacientemente, muito para lá da primeira década de 70, que o povo, e os próprios governantes, se preparassem e adaptassem para viver num regime que tinha como democrático, mas cansei-me de tanta mentira e incompetência. A partir do final dos anos oitenta, nunca mais dei a minha confiança [que é o meu voto] a nenhum partido político, e hoje - apesar disso não me dar nenhuma alegria -, não estou arrependido. O balanço que é possível fazer dos 38 anos de "liberdade de expressão" [é até ver, a única vantagem do actual regime], incluídos os milhões de fundos comunitários consumidos em estradas e Expos, é que eu estava cheio de razão.

Só não repeti a decisão de renunciar ao voto  nas eleições autárquicas, porque considero que o factor proximidade me dá um pouco mais de conhecimentos sobre o potencial dos candidatos, embora continue a discordar da forma apalhaçada como se promovem os candidatos. Chegado a este ponto, tenho como condição primeira para poder votar com segurança, a necessidade de um compromisso de honra dos candidatos, sustentado em garantias concretas, com coimas [e, justificando-se, até punições], em casos de sonegação óbvia e comprovada aos programas eleitorais. Mas isso sou eu, que me lembrei de aplicar  aos políticos, normas de segurança semelhantes às que os Bancos nos impõem a nós, quando queremos aceder ao crédito [e ninguém acha anormal]...   

Mas é impossível, e mesmo indesejável, alhearmo-nos totalmente da política, porque ela acompanha-nos em quase todos os actos da nossa vida. Por isso é que vos vou falar da candidatura de Luís Filipe Menezes à Câmara do Porto.

Acontece, e isso é natural, concordarmos episodicamente com alguém com quem raras vezes estamos de acordo. Foi o que se passou hoje comigo em relação a este artigo de Paulo Ferreira. De facto, a dupla personalidade de Luís Filipe Menezes, muito típica aliás, nos políticos, talvez sirva de mote para a decisão do meu voto para a presidência da Câmara do Porto das próximas eleições. Como já aqui escrevi, sou um admirador do trabalho realizado por LFM em Gaia. Está bem à vista, e não é folclore. Mas, esta faceta tipo troca-tintas não me agrada nada, como aliás não me agradou nada a decisão do autarca de Gaia, de meter na gaveta do silêncio a Regionalização, quando foi eleito líder do PSD, logo que aterrou na capital. Não sei mesmo se o belo trabalho produzido em Gaia, justificará dos eleitores mais exigentes a digestão das tão frequentes contradições de LFM. 

Rui Moreira, que tão indeciso deve andar quanto à sua candidatura à presidência da CMP, tem aqui uma oportunidade de oiro para capitalizar as gafes políticas de LFM. A questão, é saber se ele terá unhas para tanto. É que, para um líder se afirmar, para dar o passo decisivo, por vezes é preciso saber aproveitar as oportunidades, e não temer o confronto, mesmo que o adversário seja de peso, e tenha o apoio unânime da Comissão Política Nacional do PSD.

Até agora, ainda não encontrei razões objectivas para duvidar da seriedade de Rui Moreira, e mesmo, da sua capacidade empreendedora. Terá talvez chegado o momento para ele mostrar a sua veia de lutador e provar aos portuenses que é capaz de fazer mais e melhor que Menezes, sem se endividar tanto. É verdade que ninguém faz omeletes sem ovos, mas a imaginação ajuda muito. Por outro lado, talvez não seja muito arriscado apostar na mais que provável queda do Governo PSD/CDS, que até poderá facilitar-lhe o caminho para as próximas eleições autárquicas...

Faites vos jeux, monsieur Rui Moreira*!

* Como candidato independente, será mais complicado reunir apoios, mas vale a pena tentar.

20 novembro, 2012

Ser Juíz, será hoje uma honra?

Cega, surda, muda, inútil
Até certo ponto, percebe-se que bom número dos juízes portugueses cedam com aparente facilidade à vaidade, que advem do facto de saberem  que desempenham uma actividade intimidante para a maioria da população, que apesar de viver numa democracia de fachada, não concede aos cidadãos economicamente mais desfavorecidos os meios suficientes para os confrontar, em casos de conflito directo.  Mas já não se compreende, nem aceita, é que o seu sentido do Dever, as suas próprias exigências com a Justiça cedam a coisas tão mesquinhas  e fúteis como a vaidade exacerbada.

Paira na nossa sociedade, uma impressionante convicção, uma ideia firme e generalizada, de que é no próprio sistema judicial que se encontra o cerne de todas as injustiças, e se concentram os problemas mais graves. 

É, quase em exclusivo com a pequena criminalidade, que a Justiça em Portugal vai dando sinais de existência e de alguma produtividade. Reunidas as provas fundamentais contra o(s) autor(es) de um crime, de maior ou menor gravidade, logo se procede aos julgamentos e aplicam as respectivas sentenças. E se as infrações o justificarem [e às vezes não justificam], a cadeia, é o destino certo dos infractores. Mesmo assim, em certos casos, a Justiça usa critérios de punição contraditórios, deixando amiúde em liberdade gente cadastrada e considerada perigosa, como aconteceu ainda há poucos dias numa localidade do país. Nem para prevenir, a Justiça portuguesa acerta o passo. Se falarmos em processos de litígio entre empresas, então nem se fala. Com as pequenas empresas a Justiça só funciona praticamente para lhes extorquir impostos. Com as grandes, com aquelas empresas onde circulam muitos milhões, depende dos envolvidos...

Falar da Casa Pia, e da fantochada que tem acompanhado este processo, é já cansativo. De Vale e Azevedo, é uma vergonha para qualquer Juiz que se preze. E da prisão de luxo residencial de Duarte Lima, outra vergonha ainda maior.

Mas, pelo caminho que as coisas levam, a cereja no topo do bolo parece-me que vai ser o famoso processo dos submarinos. Como é do conhecimento público, a compra dos referidos submarinos tinha algumas contrapartidas, que obrigavam a empresa alemã que os vendeu a investir uns milhões em actividades complementares, no fabrico de peças para indústria mecânica. Eram 20 os projectos de contrato de contrapartidas! Eram, porque nunca chegaram a sair do papel... O remédio encontrado pelo Ministro da Economia [em Outubro], para "ultrapassar" o incumprimento foi acordar com a Ferrostaal, a substituição desses 20 projectos por [apenas] outros dois, desta vez supostamente ligados ao turismo, e à energia [no valor de 500 milhões de euros]... 

Vem agora o zeloso advogado dos bandidos dizer, que a renegociação contratual das contrapartidas anula a responsabilidade criminal dos falsários! E, mais! O "ilustre" advogado de defesa, Nuno Godinho Matos, não hesita em pedir o arquivamento do processo, adiantando [não, sem uma dose pesada de razão] que "o Estado português não é nenhuma virgem enganada, que é uma megera" (sic).

Querem ver que ainda vamos ter de pagar aos vigaristas? Justiça, que Justiça? Juízes? Não! Juízinhos,  sindicalistas, isso sim.    

19 novembro, 2012

Sem relho nem trabelho



Se alguém contabilizasse os milhares de horas de trabalho que todos os anos os portugueses perdem nos tribunais em esperas ou com deslocações inúteis veríamos quão anacrónico e irracional é o funcionamento do nosso sistema judicial. Os nossos tribunais funcionam sob as ordens de quem não está preparado para os administrar. Os juízes foram formados para decidir processos e não para gerir tribunais. É muito frequente haver adiamentos de julgamentos em certos dias porque as salas de audiência estão ocupadas, enquanto em outros dias nenhuma delas é utilizada.

 Outrora passava-se algo semelhante com os hospitais, mas o Estado resolveu, há décadas, esse problema formando administradores hospitalares, justamente para que os estabelecimentos de saúde fossem geridos com racionalidade e eficiência por profissionais especificamente preparados para essas tarefas. Em vez de aplicar esse modelo aos tribunais, os sucessivos governos têm assobiado para o lado, sem mostrar qualquer preocupação com os prejuízos que tal situação acarreta.

O atual Governo não só não está interessado em resolver a questão como ainda quer agravá-la através de uma reorganização do mapa judiciário completamente irracional e sem qualquer sentido estratégico. Em cerca de dez meses o Ministério da Justiça já apresentou quatro versões do mapa judiciário e a ministra já anunciou mais outra. Ora abre-se o tribunal que antes se decidira fechar; ora fecha-se aquele que antes se decidiu que ficaria aberto; ora tira-se competências a este tribunal e dá-se àquele, ora tira-se essas competências a esse tribunal para dá-las a outro. Enfim tudo parece decidir-se ao sabor do poder de grupos de pressão e do arbítrio da senhora ministra.

O Governo parece apenas interessado em colocar os municípios uns contra os outros e em dividir a própria Ordem dos Advogados, aliando-se a umas delegações contra outras com o apoio oportunista de alguns dirigentes distritais que se prestam ao papel de canas de pesca à linha. As sucessivas versões do mapa judiciário demonstram claramente que este Governo não está preocupado em servir o país e as populações, mas sim em criar fidelidades, premiar obediências e expandir clientelas.

Por que é que um diferendo de valor superior a 50 mil euros entre duas empresas de Matosinhos passará a ter de ser decidido no tribunal da Póvoa de Varzim? Por que é que um crime grave cometido em Chaves passará a ter de ser julgado em Vila Real? Por que é que o julgamento de um homicídio praticado em Abrantes passará a ter de ser feito em Santarém? Por que é que as populações de Monchique, de Mértola, de Mira e de mais algumas dezenas de outros municípios passarão a ter de percorrer dezenas (e em muitos casos mais de uma centena) de quilómetros para poderem aceder à justiça, quando têm tribunais na sede do seus concelhos, os quais, em alguns casos, foram inaugurados há poucos anos e custaram milhões de euros?
O Ministério da Justiça anunciou que os tribunais dessas dezenas de concelhos vão ser transformados naquilo que ele próprio designa como «Extensões de Proximidade», ou seja, entidades sem magistrados e apenas com funções administrativas e burocráticas. Mas não há ninguém no Ministério, no Governo ou no PSD que explique à senhora ministra que os tribunais são órgãos de soberania e que não podem ser tratados como repartições da administração pública ou como secções de uma qualquer loja do cidadão? Por que é que têm de ser as populações a percorrerem milhares e milhares de quilómetros todos os anos em vez de serem os magistrados a deslocar-se aos tribunais dos vários concelhos para, aí sim, administrarem uma justiça de proximidade em que as respetivas sentenças produzam cabalmente todos os seus efeitos preventivos e dissuasores de futuros comportamentos ilícitos?

Este Governo está a levar a cabo, na área da Justiça, uma política sem relho nem trabelho, tratando os tribunais como peças de xadrez que tenta mover ao sabor dos caprichos de burocratas ou dos interesses das suas clientelas. A justiça precisa de políticos abertos ao país e com linhas de rumo claras e não de fanáticos entrincheirados nos bunkers das suas certezas sectárias.